A Pluralidade da Fé – parte I

Sempre me perguntei o que queria Jesus dizer ao afirmar: “Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra?” (Lc 18.8). Hoje quando reflito sobre a igreja, seu testemunho no mundo e sua mensagem, não tenho dúvidas de que Jesus estava apontando para nossos dias.
Sempre que lia este texto – quando eu era um jovem ministro – imaginava o comunismo e outras ideologias dominadoras sufocando a fé das pessoas. Ao longo dos anos descobri que os sistemas de governo, sejam eles de esquerda ou de direita, inda que inibidores do pensamento humano, isto é, que não aceitam o livre-pensamento e idéias das pessoas que não as do partido, não são inibidores da fé das pessoas. Está comprovado que o evangelho cresceu forte e vigoroso nos países de regimes totalitários como na ex-União Soviética, na China e em Cuba.
Também pensei que as filosofias, os pensamentos, sofismas e a ciência fossem os elementos que minassem a fé das pessoas e, que, na volta de Cristo ele não encontraria fé na terra. Estava enganado. As teorias da evolução, os valores que a ciência tanto preza, o avanço da tecnologia, por fim, dobram-se diante da soberania e poder de nosso Deus e do evangelho de Cristo. O evangelho cresceu, apesar da filosofia dos gregos, da mão de ferro dos romanos e se espalhou pelo mundo todo. A Albânia que se considerava o baluarte do comunismo e que se gloriava de ali não haver Bíblias nem cristãos, caiu com grande estrondo e seu líder Enver Hoxa, à semelhança de outros déspotas afogou-se na arrogância que seus lábios proferiram contra Deus.
Hoje percebo que a fé verdadeira vem se perdendo sistematicamente dentro de seu próprio terreno que é a igreja. Um dos comentaristas falou sobre este texto cerca de duzentos anos atrás: “Já não existirá a doutrina da fé, haverá menos da graça da fé, e muito menos o exercício da fé, especialmente na oração e em relação à vinda de Cristo. As pessoas pouco se importarão se ele virá ou não” (John Gill).
E é fácil perceber a diluição da verdadeira fé e a pluralidade de fé na igreja. Basta ouvir os pregadores e o que eles têm a dizer. Ou exortam à prática da fé voltada para usos e costumes, coisa comum em certos segmentos pentecostais ou à prática da fé que inclui sacrifícios – dispensando a graça, isto é, em que o crente precisa “pagar” para receber as bênçãos. Vive-se hoje na igreja a pluralidade da fé, que dá às pessoas a opção de escolher a igreja, não pela essência da fé que prega, mas pelas gratificações que os pregadores prometem aos fieis.
Pode-se confirmar o que estou dizendo acessando diariamente os vários canais de tevê em que pregadores, evangelistas, pastores e igrejas anunciam o evangelho. Raramente ouvimos programas em que a verdadeira ortodoxia é pregada e em que o ouvinte é levado a confrontar seu estilo de vida com as exigências da fé e da graça. Basta também visitar os cultos de algumas igrejas e observar que a mensagem pregada sempre visa agradar o ouvinte e o seu bem-estar – especialmente nesta época em que as mensagens e os livros de auto-ajuda têm grande sucesso. Assim, pregadores como eu que creem na graça e na fé e que creem que o evangelho de Cristo traz em seu escopo a prosperidade para os que fielmente servem a Cristo, e que se recusam a trilhar pelo caminho da auto-ajuda não são muito bem ouvidos.
No aconselhamento pastoral de todas as semanas as pessoas procuram soluções rápidas, e opções que lhes agradem. Assim como vão ao meu gabinete procurando ajuda, passam por uma mão-cheia de gabinetes de outros pastores e até de seitas religiosas querendo encontrar a melhor solução para resolver seus problemas. Quando lhes apontamos o caminho da verdadeira fé, rejeitam-no porque exigirá delas um maior comprometimento com o Senhorio de Jesus Cristo em suas vidas.
Esta pluralidade de fé ou de uma fé vazia e sem fundamento vem levando um sem-número de pessoas, membros de nossas igrejas à busca frenética de divãs psiquiátricos, e a terapia em grupo em hospitais. Afora os que vivem sob medicação tarja-preta, porque acreditaram numa fé sem essência, numa fé que tem aparência de ser verdadeira, mas é enganosa. A verdadeira essência da fé, Jesus, não é bem recebida quando faz demandas e exige compromisso com sua mensagem e com o reino.
Paulo mostrou a causa deste problema aos irmãos colossenses: “Ora, como recebestes Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele, nele radicados, e edificados, e confirmados na fé, tal como fostes instruídos, crescendo em ações de graças” (Cl 2.6-7).
Para o apóstolo os problemas que temos hoje com a pulverização da crença está na maneira como uma pessoa recebe a Cristo. Se alguém aceita a Cristo apenas como seu ajudador, como seu curador, como solucionador de seus problemas e não como SENHOR, nunca se firmará na fé e terá sempre uma fé diluída. Paulo está mostrando que desde o início a pessoa tem de ser confrontada com o senhorio de Cristo, que é uma mensagem que confronta as pessoas, entre o que ela quer e o que o Senhor Jesus Cristo quer que ela faça.
Talvez aí esteja a razão de termos uma igreja tão fraca, em que os crentes vivem o evangelho que mais lhes agrada e não o verdadeiro evangelho que nos faz tomar o jugo de Cristo sobre nós. A equação é bem simples: quando vivíamos nos prazeres do mundo, nosso chefe era Satanás; agora que vivemos no evangelho de Cristo, nosso chefe é Jesus. Ou estamos sob o jugo do diabo ou sob o jugo de Jesus. A escolha é nossa.

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