PRA QUÊ VOLTAR AO PASSADO

Esta a pergunta que me fez uma senhora quando lhe falei que estava pesquisando a vida de homens célebres na história da igreja, que contribuíram grandemente para a Reforma. Por que voltar ao passado? Apaixonei-me pelo período da história da igreja que vai de 1100 a 1600 – em que pré-reformadores e reformadores mudaram o destino da humanidade pela ousadia em confrontar o sistema político-religioso de sua época.

A literatura que cobre este período não é muito vasta, mas o que existe – e o material está todo em inglês – é suficiente para nos levar a fazer uma comparação entre nossos dias e aqueles. Estudar a origem dos Irmãos que remonta ao século XIII; Irmãos que restabeleceram a ordem e o governo da igreja fora da estrutura católico-romana; os místicos alemães e ingleses que deixaram uma herança de profunda comunhão com Deus; a vida de João Wycliffe, dos seus seguidores, os Lolardos na Inglaterra; de seu discípulo João Huss e os hussitas (o mesmo que Irmãos) espalhados pela Europa; os valdenses e os grupos que não concordavam com a hierarquia católica, queimados em fogueiras, presos a estacas, torturados impiedosamente pelas artes da tortura inventadas pelos dominicanos, deixaram um legado de fé cuja vida e escritos deveriam ser revistos por todos nós.

A pessoa que me fez a pergunta questionou se deveríamos voltar ao passado, se vale a pena tal esforço, e que seria melhor esquecer tudo e seguir em frente. Não concordei com ela. Porque examinar o passado permite-nos errar menos. Aprendemos o que não deve ser feito, e descobrimos que muitas de nossas tentativas em reformar a igreja foram bem-sucedidas por estes homens no passado. Chego a acreditar que estamos precisando de uma segunda reforma. Desta feita, na própria igreja evangélica.

Descobri, estudando exaustivamente a história da igreja deste período que Lutero, o Reformador trilhou um caminho preparado havia mais de trezentos anos, por homens e mulheres que deram suas vidas confrontando o sistema papal e hierárquico daqueles dias. Quando Lutero fez a Reforma Protestante havia na Europa mais de trinta mil grupos de estudos bíblicos em lares, graças ao corajoso trabalho de Wycliffe em Oxford, de seus seguidores, os Lolardos, dos Irmãos e dos seguidores de Huss.

Aprendi também que nós, os evangélicos não somos herdeiros de Lutero, isto é, Lutero e a Reforma não exerceram tanta influência sobre nós, e sim, os pré-reformadores. Estes restauraram o sacerdócio universal de todos os santos, a prática dos dons e das boas-obras, o ministério plural na igreja e os dons apostólicos. Quando Lutero na Alemanha rompeu com o sistema católico-romano havia por toda a Europa irmãos que se reuniam foram do sistema institucionalizado, não seguiam os dogmas romanos, como a crença na transubstanciação dos elementos da eucaristia, não oravam aos santos e viviam piedosamente o evangelho de Cristo. Possuíam a Bíblia sagrada, alguns a tinham completada em seu próprio idioma e outros possuíam traduções parciais. Homens e mulheres copiavam à mão a Bíblia toda em seu próprio idioma, e a guardavam com carinho para não ser confiscada pelas autoridades eclesiásticas.

Quando Lutero entrou em Worms cerca de dez mil Irmãos deram-lhe as boas-vindas: eram frutos dos pré-reformadores. Vale ressaltar que os seguidores de Lutero, mais tarde tornaram-se os maiores perseguidores dos evangélicos. Eram os Irmãos, apelidados depois de anabatistas, e devido a Menno Simon, de menoninas e séculos depois de moravianos, quando foram acolhidos na Moravia nas terras do piedoso luterano Von Zinzendorf, de onde procedem os evangélicos de hoje. Foram os moravianos que “lincaram” os evangélicos a João Wesley que fazia parte da igreja da Inglaterra.

Pra que voltar ao passado? Porque a história de nossos pais é rica em conteúdo de fé. Para entender que periodicamente a igreja precisa rever seu rumo; para não cair no mesmo institucionalismo daqueles dias e para entender também que tudo o que queremos reformar hoje na igreja já foi feito no passado, à custa de sangue derramado, perseguições e calúnias.

Queremos uma reforma na Igreja? Então preparemo-nos para a perseguição por parte daqueles que voltaram a institucionalizar a igreja; que fizeram do ministério seus feudos-pessoais, que criaram seus reinos onde governam quais príncipes da Idade Média; que perseguem aqueles que não pautam sua cartilha, etc.

Naquela época a igreja romana dominava o cenário mundial perseguindo e matando os reformistas; hoje a força operacional das instituições denominacionais opera de maneira semelhante. Já não consegue guilhotinar nem perseguir como naquele tempo, mas possui métodos são diferentes. Os príncipes que governam os feudos regionais controlam, a partir de seus castelos e através de seus “servos” a vida de muita gente. Os feudos evangélicos de hoje detêm o poder da mídia e com ele se enriquecem, esquecendo os mandamentos de Jesus.

Pra que voltar ao passado? Para confirmar o ditado de Salomão de que tudo o que existe já existiu e voltará a existir, portanto, tudo é vaidade ou passageiro. Aprender também que homens e mulheres deram suas vidas no passado a favor de um evangelho simples e bonito, que é o evangelho de Jesus Cristo, que os homens tornaram difícil e feio.

Por isso, estou preparando uma série de livretos destacando a riqueza que homens e mulheres de Deus aprenderam com Deus no passado deixando-nos um excelente legado de fé e amor. Wycliffe e os Lolardos são os primeiros da série. Aguarde e ore para que Deus nos dê os recursos necessários para poder publicá-los.

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